A compulsão alimentar, conhecida mundialmente como um transtorno sério e crescente, ganhou um novo capítulo científico nesta semana. Um estudo publicado na revista Nature Medicine revelou de forma inédita como a tirzepatida, princípio ativo do Mounjaro, atua diretamente no núcleo accumbens, área do cérebro associada ao prazer, recompensa e vícios, modificando sinais elétricos ligados ao impulso de comer. A descoberta reforçou o que especialistas já vinham alertando há anos: episódios de “comer compulsivo” não são apenas “falta de vontade” ou “falta de controle”. Trata-se de uma condição com base biológica, neurológica e emocional. No Brasil, segundo a Organização Mundial da Saúde, ao menos 4,7% da população convive com transtornos alimentares.

A Dra. Elaine Dias JK, PHD em endocrinologia e metabologia pela USP, explica que a compulsão alimentar costuma surgir em momentos de exaustão emocional, estresse e ansiedade, quando o cérebro passa a buscar alívio imediato em alimentos altamente palatáveis, como doces e gorduras. “Os episódios trazem uma sensação momentânea de conforto, mas logo em seguida vem a culpa e o arrependimento. Quando o paciente procura ajuda médica, muitas vezes já desencadeou outras doenças, como diabetes, hipertensão, colesterol elevado e alterações hepáticas”, afirma.

O estudo da Universidade da Pensilvânia amplia essa compreensão ao demonstrar a atividade cerebral por trás desse comportamento. A pesquisa monitorou pacientes com obesidade e compulsão alimentar que possuíam eletrodos implantados no núcleo accumbens. Pela primeira vez, foi possível registrar como o desejo por comida se manifesta eletricamente. Em um dos casos mais marcantes, uma paciente que já estava utilizando tirzepatida, apresentou alterações espontâneas no padrão elétrico da região, compatíveis com redução do impulso de comer. Segundo a pesquisadora Wonkyung “Woni” Choi, autora principal do trabalho, a paciente relatou que o “barulho alimentar” havia desaparecido, expressão usada para descrever pensamentos incessantes sobre comida.

O mesmo ocorreu com a Gabrielle Santos de 23 anos, que enfrentou episódios intensos de compulsão alimentar desde a adolescência. Ela conta que vivia em um ciclo de fome emocional que se agravava em momentos de estresse e ansiedade. “Eu não tinha seletividade alimentar. Comia o que estivesse ao meu alcance, como se aquilo fosse preencher um vazio emocional. Era um pensamento constante sobre comida, como um ruído que não desligava”.

Gabrielle começou o tratamento com análagos de GLP-1 e relata que o medicamento transformou sua relação com a alimentação. “O remédio silenciou a minha cabeça. Aquela urgência mental, aquela ‘voz’ que pedia comida o tempo todo, simplesmente diminuiu”. Ela explica que não se trata de deixar de sentir fome, mas de recuperar autonomia. “Eu voltei a conseguir diferenciar fome real de impulso emocional. Passei a fazer escolhas com calma, sem agir no automático. Pela primeira vez senti que meu corpo e meu cérebro estavam no mesmo ritmo”.

Para a Dra. Elaine, esses casos mostram a importância de abordar a compulsão alimentar de forma multidisciplinar, combinando estratégias emocionais, comportamentais e, quando necessário, tratamento medicamentoso. Ela ressalta que mudanças práticas na rotina também ajudam a amenizar gatilhos, como a prática regular de atividade física, uma rotina de sono adequada, ambientes com alimentos saudáveis, meditação e terapia cognitivo comportamental.

A médica ainda comenta a importância de priorizar alimentos naturais, ricos em fibras e pouco processados. “Sempre digo que é importante descascar mais e abrir menos. O consumo frequente de ultraprocessados provoca inflamação e piora o estresse, que é um dos principais gatilhos da compulsão”, explica. Embora o estudo com o Mounjaro não represente uma cura, ele abre portas para novas abordagens e confirma o avanço da ciência no entendimento da fome emocional e dos comportamentos alimentares disfuncionais.

A médica listou algumas práticas que podem ser incorporadas à rotina para amenizar os gatilhos e beneficiar a alimentação saudável. São elas:

- Criar um ambiente saudável, magro, em casa e no trabalho: evitar um ambiente obesogênico, pois no episódio de compulsão, se tiver acesso somente a alimentos magros, automaticamente irá comê-los no lugar de opções prejudiciais à saúde.
- Dormir de 7 a 9 horas por noite: focar na qualidade do sono;
- Evitar ir tarde da noite para a cama: o ideal é que o indivíduo durma no máximo até às 23h, isso porque a partir desse horário acontecem várias alterações no ciclo circadiano de vários hormônios, como testosterona, cortisol, GH, a Grelina, a leptina, entre outros que ficam alterados durante o dia, e essas alterações levam ao aumento da fome, irritabilidade, dificultam o ganho de massa magra e músculo, pioram a composição corporal;
- Realizar a higiene do sono: criar uma rotina que ajude a preparar o corpo e a mente para o sono, como evitar luzes de aparelhos tecnológicos, estudar ou comer na cama. Dessa forma, o psicológico irá associar o quarto com a hora de dormir, promovendo a qualidade do sono;
- Ingerir comidas mais saudáveis: alimentação rica em fibras é uma grande aliada. Além da sensação de saciedade, ajuda a diminuir os níveis de açúcar;
- Realizar atividades físicas de forma regular: a sensibilidade de neurotransmissores se torna uma aliada para diminuir a vontade de consumir alimentos ruins e o tempo todo;
- Inserir a meditação no dia a dia: reduz o estresse e a ansiedade, evitando a compulsão;
- Terapia Cognitivo-Comportamental é uma grande aliada para o tratamento de compulsão alimentar periódico.

Sobre a Dra. Elaine Dias JK

A Dra. Elaine é PhD em endocrinologia pela USP, também é membro ativo da Sociedade Brasileira de Endocrinologia, onde foi professora no curso de USG de Tireoide. Em sua clínica-boutique na Oscar Freire, atua com uma equipe de profissionais multidisciplinares em um espaço acolhedor e humanizado, com tecnologias de última geração. É uma das poucas no Brasil a realizar o exame de epigenética, que permite a personalização do tratamento com a orientação de dieta e atividade física ideal para cada paciente, apontando os melhores caminhos para resultados mais efetivos.

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